quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Pontos de Vista



Todos sairam vencedores, ninguém saiu derrotado, todos estão satisfeitos e todos agradecem a confiança dos seus eleitores pois afinal não é assim tão fácil encontrar tamanho número de crentes plenos de tanta fé. Pontos de vista, será certo, não deixarão de estar correctos, cada um nada menos ou mais que o outro, daí que me permita, a mim próprio, fazer a minha própria análise segundo o meu ponto de vista que não será muito diferente, suponho eu, de 1.75% dos eleitores que votaram em branco somando no seu total 98.991 votos.
O primeiro aspecto que gostaria de salientar e passando o pleonasmo é o branqueamento do voto em branco ou a tentativa de o obscurecer nos confins do esquecimento. Não adormeci em frente ao televisor nem gravei para ver mais tarde as análises dos comentadores escolhidos a dedo mas, do que vi, não me recordo de qualquer referência ou análise mais reflectida sobre esta opção de voto e creio que esta seria pertinente. Senão vejamos, dos 16 partidos sujeitos a sufrágio nas eleições legislativas apenas cinco somaram mais votos que os eleitores do voto em branco, curiosamente os mesmos cinco partidos com assento parlamentar, os mesmo cinco partidos que constituem a base do sistema político vigente.
Dito de outra forma, o voto em branco conseguiu maior votação que 11 partidos nacionais e apenas foi superado pelas máquinas políticas e de propaganda do poder instalado.
Não vou retomar o tema ou procurar atribuir intenções à expressão do voto em branco. Já o fiz anteriormente, prefiro, em vez disso, felicitar também os eleitores, os 1.31%, os
74.273 votos nulos que demonstraram, desta forma, a sua inteligência ao fazer uso do seu direito de voto. Foram estes mais inteligentes que cerca de 40% dos eleitores inscritos que optaram por, pura e simplesmente, fazer figuras de urso.Isto, com o devido respeito para com todos aqueles que por motivos de doença ou outros perfeitamente justificados não puderam, simplesmente, exercer o seu direito de voto e com o devido respeito a todos os falecidos que continuam a fazer parte dos cadernos eleitorais.

http://legislativas2009.mj.pt/

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O Leitor


Uma falha deste blog para um amante do cinema como o seu próprio autor é o facto de não ter ainda feito qualquer referência ao género. Não o fiz ainda não apenas por falta de oportunidade mas confesso mais por falta de um filme que me convencesse.
O Leitor, "The Reader", no seu título original foi um filme que me convenceu finalmente fazendo juz às cinco nomeações para Óscar. Basedo no romance O Leitor, de Bernhard Schlink, relançou algumas perturbantes questões sobre a II Guerra Mundial, o extermínio dos judeus pelos nazis e a memória colectiva da Alemanha. Isto no contexto de uma tragédia amorosa bem urdida que serve de linha guia ao filme.
Fica a minha sugestão para os apreciadores do romance e do histórico. A não perder e mais não digo.


Let's look at the traila!

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Cântigo Negro


"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!



José Régio

Pintura "O Grito" Edvard Munch

Campanha eleitoral


Começou ontem oficialmente o período de campanha eleitoral e mais uma vez o povo português vai ter de escolher de entre todos os candidatos e projectos aquele que lhe dê mais garantias. No entanto, será que as melhores propostas são as que estão a ser escortinadas ou será que existe alguma alternativa?
Alternativa a todo um sistema disfuncional em termos de gestão,influenciável e manipulável, desproporporcionado e não representativo?
Na minha opinião, a má gestão e o óbvio escandaloso das manipulações em prejuízo do país assumiram tal proporção que as as culpas vão muito além do partido ou do governo que pontualmente assuma o poder na lógica de intercalamento a que estamos destinados. Todo o sistema que o suporta tem de responder perante tais falhas.
É de consenso que o sistema parlamentar,de representatividade do eleitor, se tornou uma farsa, desde cabeças de lista dos círculos eleitorais estranhos aos círculos que os elegem quais verdadeiros cabeças de cartaz até ao seu próprio número,reconhecidamente excessivo à anos por uma larga maioria e ainda assim teimam em manter o seu número, afinal o seu próprio número ainda que condenem ao esquecimento os próprios círculos que os elegeram. A administração de empresas privada ou semi-privadas por parte de políticos com responsabilidades anteriores na área de influência da empresa continua a ser uma realidade bem como as impensáveis derrapagens orçamentais de obras públicas ou o próprio fim dos concursos públicos.
As promessas eleitorais estão já tão ridicularizadas a tal ponto que nem os próprios partidos que aspiram ao Governo sentem necessidade de as fazer e a própria noção de projecto de desenvolvimento sustentado do país está já tão descridibilizada que não há, com este sistema político, forma de o recuperar, a tal ponto que já nem o partido com maiores aspirações ao poder sente necessidade de o apresentar.
Para além de tudo isto, se pensarmos no estado calamitoso de um país assolado por assimetrias gigantescas, socio-económicas e geográficas, se pensarmos no descrédito justificado que é ser político hoje, pergunto eu, quem, no seu juízo perfeito, com perfil para essa responsabilidade e sem segundas intenções ou interesses terá a coragem de lhe tomar mão? Por algum motivo os rostos são sempre os mesmos.
Não será necessária a bomba atómica mas a alternativa está nas nossas mãos. Aliás, continua a estar porque apesar de tudo, o que faz com que este sistema sobreviva, irónicamente, é a nossa própria mão, o nosso próprio voto ou a falta dele. Somos nós que o legitimamos, nós que lhe damos vida, nós que tanto temos sofrido pelas nossas próprias escolhas.
É tempo, porque nunca é tarde para mudar, de dar um sinal muito claro a estes senhores, basta! Chega, exige-se mudança, exige-se responsabilidade e exige-se respeito.
Na opinião de muitos, o voto em branco não faz sentido porque não traduz uma escolha. Discordo, o voto em branco traduz a escolha da mudança, diz claramente que não nos representamos neste sistema, diz claramente ao status quo:as vossas opções não me satisfazem, não me esclarecem, não respondem às necessidades do país. O voto em branco exige mudança.
Para terminar, deixo apenas um apelo, que vão votar, senão em branco, que vão votar e que expressem a vossa opção na urna, não no café, depois de jantar com os amigos,no trabalho ou na fila do banco ou das finanças, aí será inconsequente tal como o sistema democrático que nos (des)governa. Para quem disse à um tempo atrás: quem não chora não mama, eu digo: quem não vota não chora!


PS Os frigorícos e demais electrodomésticos apenas serão entregues aos meus eleitores após o acto eleitoral e mediante fotocópia autenticada do boletim de voto.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Direito de Antena


Preto de luto encontra-se Portugal,políticamente morto, cumpre-nos o luto; não de preto mas de branco. Exerça o seu direito, cumpra a sua obrigação, seja intelectual e moralmente sério consigo mesmo, cobre o seu voto, exiga respeito e dignidade. Vote em branco.

Sal que não salga


Sal que não salga

Por Pe. Antônio Vieira

Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber.

Suposto, pois, que ou o sal não salgue ou a terra se não deixe salgar; que se há e fazer a este sal e a esta terra?

O que se há e fazer ao sal que não salga, Cristo o disse logo: "Quod si sal evanuerit, in quo salietur? Ad nihilum valet ultra, nisi ut mittatur foras et conculcetur ab hominibus". Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à doutrina e ao exemplo, o que se lhe há e fazer, é lançá-lo fora como inútil para que seja pisado de todos.


Assim como não há quem seja mais digno de reverência e de ser posto sobre a cabeça que o pregador que ensina e faz o que deve, assim é merecedor de todo o desprezo e de ser metido debaixo dos pés, o que com a palavra ou com a vida prega o contrário.

Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga.

Está na altura de abrir mão. O Verão acabou e o mar começa a perder o seu encanto. Aliás, ou o o mar começa a perder o seu encanto ou os meus olhos começam a perder o encanto pelo mar. É do mar o que gosto mais no Verão mas será esta falta de encanto resultado da violação de espaço de um de nós? Mais do que uma longa extensão de água salgada ligada a um oceano, qual vida ligada à nossa existência, ele reflecte mais que o Sol, reflecte o nosso próprio ânimo em determinados momentos da vida. As marés que lhe proporcionam a vida, com altos e baixos são isso mesmo, meras pegadas na caminhada do nosso percurso, já as marés vivas são uma espécie de aviso ao nosso espírito para que nos recordemos que estamos longe de controlar tudo, a areia foge-nos constantemente debaixo dos pés e quem nunca foi enrolado por uma onda?
É altura de darmos espaço um ao outro para que, para o ano, o encanto regresse, o frio e a chuva para isso vão ajudar concerteza.A distância é apenas um pormenor, pode ser que nos vejamos entretanto.